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Embrapa confirma a importância da biodinâmica para a agricultura e o meio ambiente

25 de fevereiro de 2016
Ilustração de Steiner com giz sobre quadro negro durante uma das palestras sobre biodinâmica.
Ilustração de Steiner com giz sobre quadro negro durante uma das palestras sobre biodinâmica.

A agricultura biodinâmica e a orgânica foram sempre muito criticadas porque funcionariam apenas em pequenas áreas e nunca seriam capazes de alimentar a humanidade!

Sendo assim podemos nos animar com o fato de que os pesquisadores e técnicos da EMBRAPA, autores do documento “Integração Lavoura-Pecuária-Floresta” -ILPF, confirmam – de maneira indireta, mas inequívoca – que biodinâmica (e orgânica) são caminhos sérios que anteciparam (em 90 anos) a adoção de técnicas que nos permitem não apenas alimentar a humanidade com a quantidade e a qualidade necessárias, mas que, além disso, contribuem para regenerar a vida do planeta ameaçado pela aplicação de técnicas agropecuárias reducionistas, unilaterais e dissociadas entre si e do seu meio.

Essa é a conclusão a que o próprio leitor poderá chegar ao comparar os dois grupos de textos que se seguem, bastando para tal substituir o termo “Integração Lavoura-Pecuária-Floresta – ILPF” por biodinâmica (ou orgânica), pois é justamente essa integração uma das características marcantes desses caminhos de praticar agricultura, pecuária, fruticultura e floresta. A vida na natureza baseia-se em ciclos integradores e a agricultura deve inserir-se para não causar a destruição.

EMBRAPA em 2015

Trechos extraídos do documento “Integração Lavoura-Pecuária-Floresta” -ILPF (http://mais500p500r.sct.embrapa.br) publicado no ano passado por um grupo de pesquisadores e técnicos da EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).

Com o aumento da demanda por alimentos e a evolução tecnológica na produção, a atividade agrícola moderna passou a caracterizar-se por sistemas padronizados e simplificados de monocultura. Esse modelo de produção agropecuária predomina nas propriedades rurais em todo o mundo. Entretanto, tem mostrado sinais de fragilidade, em virtude da elevada demanda por energia e por recursos naturais que o caracteriza. E uma solução para amenizar esse problema é a adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), de forma a conciliar eco eficiência e desenvolvimento socioeconômico, aumentando a produtividade agropecuária e preservando os recursos naturais. A adoção desse sistema corresponde a uma forma de intensificação sustentável da produção agropecuária.

A integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é definida como uma estratégia de produção sustentável que integra atividades agrícolas, pecuárias e florestais, realizadas na mesma área. A implantação desses sistemas ocorre com base nos princípios da rotação de culturas e do consórcio entre culturas de grãos, forrageiras e/ou espécies arbóreas, para produzir, na mesma área, grãos, carne ou leite e produtos madeireiros e não madeireiros ao longo do ano.

Os modelos monoculturais, com base em práticas inadequadas não sustentáveis, têm causado perda de produtividade, ocorrência de pragas e doenças, além de degradação do solo e dos recursos naturais, ou seja, apresentam sinais de fragilidade, em virtude da elevada demanda por energia e por recursos naturais. Além disso, os sistemas com base na monocultura têm alto risco econômico, pois não são diversificados. Já os sistemas de integração promovem a diversificação de atividades, com maior estabilidade de renda, aumento da biodiversidade e interações biofísicas sinérgicas entre os componentes, com benefícios à produtividade agropecuária e à sustentabilidade das propriedades rurais.

Quando se trata de integração lavoura-pecuária (ILP), especialmente no sistema de rotação lavoura-pasto, há aumento de produtividade de grãos cultivados após a pastagem, que também produz mais após o solo ter sido utilizado para cultivo de grãos. E essa pastagem mais produtiva resultará em maior ganho de peso de bovinos ou produção leiteira. Em sistemas de integração que contêm o componente florestal, pode-se adicionar ainda a receita proveniente da comercialização de produtos madeireiros e não madeireiros obtidos no mesmo espaço, além de outros benefícios.

Um aspecto importante a ser considerado é a melhoria da imagem dos produtores brasileiros, de uma maneira geral, pois conseguem conciliar o aumento da produção com a preservação ambiental.

STEINER em 1924

Seleção e adaptação de trechos extraídos das 8 palestras que Rudolf Steiner (editor da obra científica de Goethe e fundador da Antroposofia e do movimento de agricultura biodinâmica) proferiu em 1924 para um grupo de agricultores e pesquisadores, já naquela época, preocupados com os descaminhos dos métodos agrícolas que atualmente ameaçam o planeta como um todo.

O adubo mineral [químico] é o que, com o tempo, deverá cessar por completo. Pois qualquer adubo mineral faz com que, após algum tempo, os produtos das lavouras adubadas com ele percam valor nutritivo. Esta é uma lei bem geral. O adubo químico é algo de que não se necessita mais e desaparecerá com o tempo. Ele será suprimido sobretudo por uma questão de economia.

Hoje estamos habituados a estudar uma planta por sí só, e a partir dela observar uma espécie vegetal por si só, para ao lado desta, por outro lado, observar outra espécie por si só. Isto é então ordenado de um modo bem bonito em compartimentos, encaixado em espécies e gêneros.

Entretanto não é absolutamente assim que ocorre na natureza. Nela tudo está interagindo mutuamente. Uma coisa sempre atua sobre a outra. Hoje, na era materialista, perseguem-se apenas os efeitos grosseiros de uma coisa sobre a outra – quando uma coisa é devorada pela outra ou digerida pela outra, ou quando o esterco dos animais chega aos campos de cultivo. Em geral só se perseguem essas interações.

Mas em realidade, além dessas interações grosseiras ocorrem continuamente interações tanto mediante forças mais sutis como mediante substâncias mais sutis o calor, o elemento etérico químico atuando constantemente na atmosfera, o éter vital. E sem levar em consideração estas interações mais sutis não se consegue progredir em determinados aspectos da empresa agropecuária.

E deveríamos entender que o crescimento [vegetal] em solos de regiões onde florestas e áreas de cultivo se alternam, está sujeito a leis inteiramente diversas das existentes em áreas desprovidas de florestas. Quando a floresta está presente de modo natural em alguma região, podemos admitir que ela tem a sua utilidade para a agricultura circundante e para a vegetação herbácea e arbustiva à sua volta. Por isso deveríamos ter a noção de não exterminar a floresta em tais regiões, e sim cuidar bem dela.

Toda vez que percebermos uma vegetação empobrecida, deveríamos concordar em não fazer todo tipo de experimento voltado meramente para a lavoura, mas em aumentar um pouco as áreas de floresta na proximidade. E quando notássemos as plantas crescendo exageradamente, sem força germinativa suficiente, deveríamos certamente diminuir as áreas florestadas. O dimensionamento da floresta simplesmente faz parte da atividade agrícola e precisa ser observado pelo lado espiritual, segundo toda a sua envergadura.

Fica evidente que Steiner não apenas sugeriu técnicas, mas também explicou as razões do seu funcionamento, como no caso das florestas ao descrever a influência que estas exercem sobre o meio circundante. E é gratificante notar-se que um órgão da importância da EMBRAPA esteja confirmando experimentalmente o que foi descrito em 1924 nos dias em que nascia o movimento de agricultura biodinâmica.

É de se esperar que um diálogo entre esses movimentos tão distintos possa ser estabelecido o quanto antes para que da nova diversidade brote a nova vida que o nosso planeta e todos seus habitantes tanto precisam.

Marco Bertalot-Bay, economista

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