Rede comunitária para acesso ao mercado pelos produtores orgânicos

Prefeito de São Paulo veta mais orgânicos na merenda escolar

6 de maio de 2013

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, vetou na íntegra, em 24 de abril, Projeto de Lei 447/2011, de autoria do vereador Gilberto Natalini (PV), que propunha que 30% dos recursos destinados à merenda escolar municipal fossem destinados à aquisição de alimentos orgânicos. Se Haddad sancionasse a lei, as escolas públicas municipais ganhariam em qualidade alimentar, já que pelo menos 30% das refeições teriam de ser compostas com alimentos orgânicos, que são produzidos sem agrotóxicos e adubos químicos e têm por obrigatoriedade e intenção preservar o meio ambiente, respeitar condições trabalhistas e promover o comércio justo. O projeto de lei ia além e instituía que os produtos orgânicos produzidos no município de São Paulo teriam preferência sobre os originários de outros municípios, quando em igualdade de condições de preço, qualidade e prazo de entrega.

Ainda há outra lei tramitando na Câmara Municipal e que obriga a prefeitura a comprar a maior parte dos alimentos de agricultores familiares do município de São Paulo. A cidade tem, principalmente nos extremos das zonas sul e leste, cerca de 400 produtores – vários deles em processo de conversão para a agricultura orgânica, dentro de um programa gerenciado pela própria prefeitura paulistana, o Protocolo de Boas Práticas Ambientais, já que a maioria desses agricultores está instalada em áreas de manancial, nas Represas Billings e Guarapiranga.

Entre as razões do veto, Haddad argumentou que a verba destinada à alimentação escolar no município é composta de recursos próprios e principalmente de repasses do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), e que, por isso, o município já estaria obrigado a utilizar no mínimo 30% do total da verba do FNDE na aquisição de alimentos oriundos da agricultura familiar, dando-se prioridade a alimentos orgânicos ou agroecológicos, “sempre que possível”.

Alegou, porém, que produtos orgânicos são produzidos em baixa escala e não teriam condições de dar conta de 30% do 1,3 milhão de refeições diárias em 1.800 escolas da rede municipal. Outro argumento utilizado por Fernando Haddad foi que orgânicos são mais caros do que os alimentos convencionais. Alegou, ainda, que orgânicos não têm padronização, como têm os alimentos convencionais, “não permitindo sua separação em lotes homogêneos, dificultando sobremaneira não só sua inclusão em alguma tabela oficial de preços capaz de nortear as futuras aquisições da Administração Pública, encarecendo consideravelmente a merenda, mas também a própria vistoria técnica e o controle da certificação a serem realizados pelo Departamento de Merenda Escolar da Secretaria Municipal de Educação previamente à sua liberação”. Considerou, por isso, a medida “prematura” e a vetou integralmente.

Foto: João Bittar

Triste notícia, já que, quando candidato à Prefeitura paulistana, Fernando Haddad foi um dos únicos candidatos que assinaram o compromisso proposto pelo movimento orgânico de estimular a produção agroecológica dentro do município de São Paulo. Na ocasião, Haddad comprometeu-se com a Plataforma de Apoio à Agricultura Orgânica de São Paulo, que tem o objetivo de estimular a produção orgânica e tornar viável economicamente os produtores orgânicos paulistanos.

O secretário-executivo da Associação de Agricultura Orgânica de São Paulo (AAO-SP) – uma das entidades que articulam a Plataforma –, Márcio Stanziani, não se deu por vencido e discorda dos argumentos do prefeito. Ele defende que, apesar de a produção orgânica paulistana efetivamente ainda não conseguir atender à demanda do município, esta lei seria um grande incentivo a esta mesma produção. “Isso atrairia muita gente para este mercado”, diz.

Sobre a falta de padronização alegada por Haddad, Stanziani lembra que esta padronização é típica da agricultura convencional e que os orgânicos, pelas próprias peculiaridades da produção, não teriam condições de seguir padrões de tamanho e cor, por exemplo, além de seguirem estritamente as regras da sazonalidade – o que não acontece com os convencionais, que são produzidos fora de época à custa da aplicação massiva de agrotóxicos contra doenças e ataques de pragas.

Além disso, diz Stanziani, os padrões e uniformização adotados no comércio de produtos convencionais não significa que estes alimentos sejam mais saudáveis, como efetivamente são os orgânicos – tanto para a saúde humana quanto para o meio ambiente. Stanziani alega que, agora, o movimento envolvido na Plataforma vai traçar outras estratégias para efetivamente garantir o estímulo à produção orgânica no município de São Paulo.

Eis a íntegra do veto:

RAZÕES DE VETO

PROJETO DE LEI Nº 447/11

OFÍCIO ATL Nº 049, DE 24 DE ABRIL DE 2013

REF.: OF-SGP23 Nº 0515/2013

Senhor Presidente

Por meio do ofício em epígrafe, Vossa Excelência encaminhou à sanção cópia de lei decretada por essa Egrégia Câmara, em sessão de 26 de março de 2013, relativa ao Projeto de Lei nº 447/11, de autoria do Vereador Natalini, que “dispõe sobre critérios para a introdução de alimentos orgânicos na merenda escolar na rede pública de ensino do Município de São Paulo”. De acordo com a justificativa apresentada, a propositura visa incentivar a prática de produção ecologicamente sustentável, fixando, para tanto, a destinação de, no mínimo, 30% (trinta por cento) da verba destinada à alimentação na rede pública de ensino para a aquisição de alimentos definidos como orgânicos. Sem embargo de seu meritório propósito, a medida não reúne condições de ser convertida em lei, impondo-se seu veto total, nos termos das considerações a seguir aduzidas. De início, cumpre assinalar que a verba destinada à alimentação escolar do Município de São Paulo é composta de recursos próprios municipais e, principalmente, de repasses do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Assim, por força do disposto no artigo 14 da Lei Federal nº 11.947, de 16 de junho de 2009, o Município já está obrigado a utilizar o mínimo de 30% (trinta por cento) do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE na aquisição de gêneros alimentícios oriundos da agricultura familiar e do empreendedor rural ou de suas organizações, priorizando-se, nos termos do artigo 20 da Resolução/CD/FNDE nº 38, de 16 de julho de 2009, os alimentos orgânicos e/ou agroecológicos, sempre que possível.

Além disso, é sabido que os produtos orgânicos, tais quais aqueles obtidos em sistema orgânico de produção agropecuário ou oriundos de processo extrativista sustentável e não prejudicial ao sistema local, nos termos do artigo 2º da Lei Federal nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003, ainda são cultivados em baixa escala, representando, segundo informações da Associação Brasileira de Orgânicos, menos de 2% (dois por cento) de toda a produção nacional. Ao mesmo tempo, esse tipo de alimento, devido ao próprio método produtivo e característica, se mostra à toda evidência mais caro do que o originado da agricultura convencional – muitas vezes superando os limites de acréscimo admitidos pela Resolução nº 39, de 26 de janeiro de 2010, do Grupo Gestor do Programa de Aquisição de Alimentos, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome –, sendo possível, inclusive, que não se apresente no mercado em quantidade apta a satisfazer a demanda gerada a partir da determinação contida na referida propositura. Nestes termos, principalmente se for considerada a dimensão do Programa de Alimentação Escolar da Cidade de São Paulo, no qual são fornecidos e distribuídos insumos para produção de 1,3 milhão de refeições diárias em mais de 1.800 unidades escolares, a existência de alimentos orgânicos em quantidade insuficiente para atender a todas elas, além de prejudicar a execução dos cardápios, trará repercussão de ordem negativa, na medida em que a ausência de parâmetros objetivos para essas situações levará a um tratamento diferenciado entre os diversos equipamentos educacionais do Município. É importante registrar, outrossim, que esses alimentos não possuem classificação específica que possibilite sua separação em lotes homogêneos, dificultando sobremaneira não só sua inclusão em alguma tabela oficial de preços capaz de nortear as futuras aquisições da Administração Pública, encarecendo consideravelmente a merenda, mas também a própria vistoria técnica e o controle da certificação a serem realizados pelo Departamento de Merenda Escolar da Secretaria Municipal de Educação previamente à sua liberação. Por tudo isso, apesar de reconhecer a importância que os alimentos orgânicos vêm conquistando no cenário brasileiro, não se pode olvidar que a formulação de qualquer política pública destinada a fomentar a produção e insumo desses gêneros alimentícios deve levar em conta a complexidade da questão e contar, necessariamente, com o envolvimento articulado de múltiplos setores da sociedade civil. Desse modo, tenho que a presente medida se revela ainda prematura, devendo, antes de sua efetiva aplicação pelos órgãos municipais, ser objeto do mais amplo debate entre todos os envolvidos, notadamente o Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional e o Conselho de Alimentação Escolar, tornando-a, aí sim, plenamente exequível. Vale consignar, por fim, que a Secretaria Municipal de Educação, com o propósito de oferecer uma alimentação equilibrada, adequada e saudável, já vem elaborando os cardápios de forma a priorizar essencialmente os gêneros alimentícios que se configuram em referências nutricionais, sempre pautada nos preceitos básicos da nutrição e nas normatizações e objetivos formulados pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar. Nessas condições, com fundamento no artigo 42, § 1º, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, vejo-me na contingência de vetar, na íntegra, a mensagem aprovada, devolvendo o assunto à apreciação dessa Colenda Câmara que, com seu elevado critério, se dignará a reexaminá-lo. Na oportunidade, renovo a Vossa Excelência meus protestos de apreço e consideração.

FERNANDO HADDAD, Prefeito

Ao Excelentíssimo Senhor

JOSÉ AMÉRICO DIAS

Digníssimo Presidente da Câmara Municipal de São Paulo

Fonte: Portal Orgânico

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